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Local: Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil

Quem passou pela vida em branca nuvem/ E em plácido repouso adormeceu;/ Quem não sentiu o frio da desgraça,/ Quem passou pela vida e não sofreu,/ Foi espectro de homem - não foi homem,/ Só passou pela vida - não viveu. (Francisco Otaviano)

11.6.07

Ode ao Entendimento

Tens mais de conquistas do que eu...
Sei que é difícil um pardal enjaulado,
Muito mais que um bicho-preguiça.

Sei disso porque sou bem mais fraco.
Sou mais urubu que circunda carniça,
Que as aves que encorajam traçados.

Sou mais um porco aproveitando a sobra
Ou um rato vasculhando a carne próxima,
Que uma águia migrando e criando rotas.

Entendo tua ânsia por tanta liberdade.
Como se, na caverna em que moro escondido,
Crescessem tuas flores e tuas folhagens.

Sou mais um morcego enrolado nas asas,
Que um colibri enroscado nas gramas,
Que um pelicano empapado nas águas.

Entendo tua luta por tanta verdade.
Como se, na parede em que escrevo teu nome,
Escorressem memórias que desconstróem frases.

Sou mais memórias, de fato, que expectativas;
Mais um silêncio contigo, que tantas outras gritarias;
Mais solidão contigo, que outra inútil companhia.

Pois entendo teu gosto pelo acaso,
Como se, na claridade em que perco teus sonhos,
A luz não deixasse que víssemos rastros.

Sou mais sofrimento na tua ausência!
Se convivência alguma nos restasse,
Me seria cruel conviver comigo apenas.

Entendo teu apreço pelo inesperado,
Como se, em cada buraco no gelo,
Brotasse uma flor de primavera
Ou uma gota de água-de-cheiro.

Ou um pingüim distraído pulasse,
Quando o urso polar o espera.

Entendo tua espera pelo sentimento,
Como se, num derradeiro fumo de rolo,
O trago primeiro assim o fosse do vento.

Porque sou mais sorrateiro que um gambá
Que finge-se de morto e fede ao predador.
Muito mais gambá que lutador, muito mais!

Porque não tenho forças para rejeitar
Como a corredeira faz aos salmões.
Nem para fazer o que o salmões fazem
Na piracema, enfrentando o desaguar.

Entendo teu esmero ao respeitar o tempo,
Como se, no pouco espaço que temos,
Guardássemos um tempo diferente
Do tempo em que vivemos.