Da Poesia Viva

Minha foto
Nome:
Local: Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil

Quem passou pela vida em branca nuvem/ E em plácido repouso adormeceu;/ Quem não sentiu o frio da desgraça,/ Quem passou pela vida e não sofreu,/ Foi espectro de homem - não foi homem,/ Só passou pela vida - não viveu. (Francisco Otaviano)

27.4.09

Despedida

Veio em má fonte, essa mágoa,
arrastada e n'água diluída,
feito choro de abastarda,
numa falsa e mora despedida.

21.4.09

Arrebol

Hoje, acordei sem motivo.
Não era dia de despertar
mandado por um sino
ou pelo som de um relógio maldito,
gritando no lençol.

Era dia, hoje, de dormir,
de sonhar,
de arrancar as sombras
do meu quarto
e, num súbito arrepio,
afastar o calafrio que me causa
o arrebol.

20.4.09

Da Cantora

Já cego de tanto,
o vento sopra como o som das cabras,
o ranger dos ossos de um crânio,
como estática.

Passo pelo ponto zero,
marcado em todo fim de tarde.
Uma vida serena,
a cada pedacinho que se sabe,
que só avança as horas
quando o sentimento as leva.

Ando até depressa por ela,
feito ciranda de férias,
feito criança numa vida
em que vale o quanto pesa.

Vejo, em cada céu, uma estrela.
Uma lágrima em cor de luz
que arrebata a noite negra.

Faço um pedido ao tempo
e a cada moço que invento,
e que, dentro de mim, é supresa.

E caem os pingos da chuva,
debulhando o folguedo.
A mecânica dos astros acelera
a cada gole de cachaça.
Beijo a Lua com meus olhos
embrumados do sereno
- não sei se a Lua que é tonta
ou se é gelado meu frio beijo que a enlaça.

Numa saideira,
meu suor se transforma em cordão.
Minha sina de rodar os céus
revelando minha vida em peleja,
separa-me de mim: meu corpo de minh'alma;
meus pés descalços,
da fina areia do chão.

E cá estou novamente,
rodeado por sereias onde não vê-se mar;
onde não há palco, em meio às bailarinas.
Onde as cores mentem às vistas,
e o que os olhos parecem certos de achar.

Silêncio d'Alma

Ando deveras cansado da fala.
Fatigado feito sola de sapato.
E, mesmo calado - como o pretendo sempre -,
um suspiro me arranha à maneira das unhas de um gato.
Falo o necessário.
Tão logo, o ar que não agarro,
fere meus lábios tendo a liberdade no desejo.
Sinto-os tão mudos e lacrados,
que o som rebate e volta seco e rasgado
às paredes fracas do meu peito.

7.4.09

Controle e Distinção

Não sei mais distinguir-me do sonho.
Nem quando aquieto,
nem quando sinto em mim,
dentro de mim,
um redemoinho em desafeto.

Não sei quando estou sozinho,
entre os olhos e a nuca,
vivo como nunca,
Ou quando vago entre as pernas da loucura
procurando, intrépido, um abrigo.

Não sei distinguir-me mais de mim.
Se estou ancorado ao inferno
Ou pendurado ao paraíso.
Eu, comigo e mais nada.

Não sei se aplaudo
Ou se invejo.
A dor maior é saber-se não amado
como o amor deveras seja.
(Ou deverás mágoa).

Não sei mais distinguir a dor
da fadiga.
A falta de um ardor que cativa
ou do gosto de uma ferida aberta.

Não sei mais saber de amor
- do qual saberia.
Nem da sua ida,
Eu, cá deixado no escuro da espera.

Não sei de saber-me da vida:
Se amar é virtude do eterno,
do etéreo,
Ou se amar é a medida
de uma saudade,
quando parece-me saudade ainda.

5.4.09

Sentido

Às vezes, procuro um sentido nas bocas.
Palavras ou lábios, ou coisas de namorado.
Mas digo-me a mim mesmo - e sei do que falo:
Não há sentido nenhum na vida,
Se não há, dentro dela, um beijo apaixonado.