Da Poesia Viva

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Local: Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brazil

Quem passou pela vida em branca nuvem/ E em plácido repouso adormeceu;/ Quem não sentiu o frio da desgraça,/ Quem passou pela vida e não sofreu,/ Foi espectro de homem - não foi homem,/ Só passou pela vida - não viveu. (Francisco Otaviano)

24.9.08

Sortilégios e Heresia

A vida é áspera
dentro das pálpebras.
Como é áspera a terra
sentida de perto:
dentro dela que é
onde se abrigam as almas
enquanto mortas.

Áspera como a espuma das ondas
e a plenitude das garças.
Áspera, como é áspera a doçura
e o açúcar nas saias
e o rijo das nádegas levando o corpo
e as frases encadeadas pelos outros
em docas amaldiçoadas.

A vida é áspera
dentro das pálpebras.

16.9.08

Três Partes

É uma constante minha, ser único.
Não faz parte de mim, a variedade.
Mas ela revira e volta ao fundo
quando meu mundo se mostra em três partes:
eu, ela e a saudade plena de tudo.

A Priori

Quando o sentimento se encerra
na poesia, é que o amor se desintegra,
e ele mesmo se encarrega
de uma solidão que principia.

8.9.08

Crescimento

Comecei a escrever por necessidade. Porque pareceu-me inevitável escrever como para a criança é inevitável chorar. Uma espécie de sobrevivência instintiva. Cada letra é uma coceira nos olhos freando o sono, e os braços esticados pedindo colo.
Vi meus versos tomarem forma, perderem peso e pujarem a estatura, até que começaram a usar roupas na frente das pessoas. Só criança tem o luxo de andar nua. Vesti meus versos com imaginação, mas, nessa idade, roupas duram pouco.
Da infância que passou, meus versos começavam a escrever por si só, se considerando maduros. Vestiam-se de futuro, numa algoz escapada da vida. Agrediram-me, esmurraram as portas com palavras duras e fonemas perdidos. Nunca acharam que a vida teria sentido se não fosse pela dúvida.
Vi meus versos tomarem rumo, perderem medos e pujarem o escrúpulo. Só criança tem o direito ao lúdico. Onde estiverem agora, meus versos se empregam pelo mundo, amando e desiludindo-se como sempre fiz: intenso, apaixonado e amiúde.

Naufrágio e Tesouro

Um dia chuvoso, nostálgico,
com cheiro de ferrugem e de lodo;
um dia em que lembro desgostoso
das águas em que se afundaram meus olhos,
num dia de naufrágio.
Quase Outubro... de novo o presságio,
a pertinência de me ver medrado,
dia após dia. E um par
de anos me passam, quando espero milênios
ainda, num porvir ao teu lado.